sexta-feira, 11 de abril de 2014

Quantas medalhas o Brasil deveria ganhar?


A pouco mais de dois anos de receber a Olimpíada, os sinais não são nada encorajadores – nem na parte de organização, nem na parte esportiva. Previsivelmente, governo e confederações mantiveram políticas míopes e de última hora, que privilegiam sempre os mesmos, e que terão como consequência um resultado decepcionante no quadro de medalhas (só haverá crescimento graças ao “fator casa”).

Mas aí vem uma questão: na verdade, quantas medalhas o Brasil “deveria” ganhar? Para um país de nosso porte, qual seria um desempenho adequado no quadro de medalhas? Se as 17 ganhas em Londres foram poucas, será que 30 seriam suficientes? Ou talvez 40? Ou 50???

Para fazer esse cálculo, primeiro precisamos encontrar uma variável econômica/geográfica que tenha uma forte correlação com o número de medalhas ganhas pelos países (uso sempre como referência o total de medalhas – e não o número de ouros – porque permite menos distorções). Pode-se imaginar três hipóteses: tamanho da população (mais gente = mais atletas de ponta), tamanho do PIB (economia maior = mais dinheiro para investir em esporte) e PIB per capita (população mais rica = mais dinheiro “sobrando” para lazer e esporte).

Primeiro, vamos comparar as populações dos 150 países com mais habitantes no mundo e seus desempenhos na Olimpíada de 2012:


*A correlação traçada é linear; ela se apresenta como uma curva porque o gráfico está apresentado em escala logarítmica.

Comparando população com medalhas, chegamos a um coeficiente de determinação (r²) de 0,209. Em termos leigos, isso significa que as duas variáveis provavelmente estão correlacionadas, mas essa relação não é forte.

Vejamos, agora, como fica a comparação entre o Produto Interno Bruto (ajustado pela paridade do poder de compra, para eliminar distorções cambiais) das 150 maiores economias do mundo e o desempenho no quadro de medalhas:


*A correlação traçada é linear; ela se apresenta como uma curva porque o gráfico está apresentado em escala logarítmica.

Aqui, o coeficiente de determinação é bem mais alto: 0,688. Para a área de ciências humanas, trata-se de um número expressivo. Ou seja, dá para afirmar que o tamanho do Produto Interno Bruto de um país influencia bastante a quantidade de medalhas que ele ganha nos Jogos Olímpicos.

Uma curiosidade: se compararmos apenas o número de medalhas de ouro com o PIB, o coeficiente de determinação fica ainda maior – chega a 0,727.

Por fim, vamos comparar o PIB per capita (tamanho do PIB dividido pelo número de habitantes) desses mesmos 150 países com seu desempenho na Olimpíada de Londres:



Desta vez, o coeficiente de determinação ficou apenas em 0,026. Isso significa que não há relação entre o PIB per capita e o desempenho nas Olimpíadas.

Levando em consideração as três comparações, dá para concluir que ser um país rico (PIB per capita), como, por exemplo, Luxemburgo, não adianta; ser muito populoso, como a Índia, ajuda, mas não é suficiente. A variável que realmente está ligada ao sucesso na Olimpíada é o PIB, que, na prática, leva em conta a riqueza e o tamanho do país ao mesmo tempo.

Voltando à pergunta original: e então, quantas medalhas o Brasil deveria ganhar na Olimpíada?

A partir da curva de regressão calculada pelo Excel, um país com um PIB do tamanho do Brasil deveria ganhar nada menos que 26 medalhas em uma Olimpíada – 9 a mais do que o Brasil levou em Londres. É um número considerável, mas factível de se alcançar em 2016 (graças ao fator casa).

Comparando-se a previsão baseada no PIB com a realidade, apenas 6 países saíram-se pior que o Brasil em 2012: Estados Unidos, China, Japão, Índia, México e Indonésia. No caso dos três primeiros, é evidente que o déficit deve-se ao fato de que, por contarem com PIBs imensos, os países acabam com “metas” de medalhas impossíveis de serem alcançadas. Já os outros três (assim como o Brasil) sem dúvida têm desempenhos esportivos incompatíveis com a importância de suas economias.

No outro lado da moeda, os países que mais superaram suas projeções foram Rússia (55 medalhas além do previsto pelo PIB!!!), Reino Unido e Austrália. Mesmo os britânicos tendo sido favorecidos por jogar em casa, seu bom resultado, assim como o de russos e australianos, pode ser creditado a investimentos altos e bem planejados na área esportiva.

Se fizermos, a título de curiosidade, a mesma projeção com base na população, o Brasil se sai ainda pior: com seus mais de 200 milhões de habitantes, o País deveria ter voltado para casa com 36 medalhas. Por outro lado, se o parâmetro fosse o PIB per capita, o Brasil não precisaria ter trazido medalha nenhuma (assim como todos os outros países com valor inferior a $ 15.800).

4 comentários:

  1. Boa escolha de análise. Uma observação extra que pode-se fazer (apesar de ser muito mais difícil quantificar e analisar) é o investimento real nos esportes. Porque ter um Guga ganhando títulos não significa um investimento naquele esporte específico, e sim no esforço individual do atleta (e de quem o apoia), tanto que, pode-se ver no tênis (ou na maioria dos esportes que o Brasil ganha medalha), que não há uma continuidade, não se aproveita nem o "boom" de um sucesso específico. A Sérvia, por exemplo, muito menor, têm alguns tenistas entre os melhores do mundo. Isso é mais sinal de investimento do que um cara só aparecendo. Sábado vi a final de Superliga B de vôlei. Nível baixíssimo, erros primários. Jogo muito distante do que é uma seleção. Isso me fez abrir os olhos de que nem o vôlei tem o investimento necessário como esporte básico, apenas um na elite da elite para mostrar que ganhamos medalhas.

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  2. Ah, só completando o comentário anterior, o que eu quis escrever também com aquele texto: Que é muito diferentes investir em meia dúzia de atletas pra mostrar que tem um esporte de elite, do que se criar realmente um programa de incentivo para, por exemplo, tirar as crianças das ruas... enfim, um projeto social digno.

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    1. É verdade! O problema é que no Brasil há a cultura de só investir em quem já está ganhando. Isso acaba corroendo os próprios resultados dos atletas de ponta, no futuro (sem falar na questão social).
      Em termos de investimento esportivo, sempre me admiro com a Espanha. Mesmo em crise e menor que o Estado de São Paulo, tem a melhor seleção de futebol do mundo, o melhor tenista, um grande piloto de Fórmula 1, uma seleção de basquete forte...

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    2. Pois é, e no próprio futebol, motivo de orgulho para os brasileiros, ainda tem um sucesso relativo. Não se investe muito, mas os resultados saem ainda pela quantidade. Se pensarmos bem, o Brasil têm uma população maior que 20 "Holandas", mas acaba disputando com a mesma de igual pra igual em uma Copa do Mundo. Eu orgulhar-me-ia mais se fosse uruguaio, por exemplo, com 2 copas do mundo, 2 ouros olímpicos e 15 copas américa, mesmo sendo o país de menor população e menor área da Conmebol, do que sendo brasileiro, com 5 copas do mundo, 8 copas américa, mas com população maior que todos os outros países da América do Sul juntos... E isso que citei só o futebol, que é o único que o brasileiro médio realmente dá bola. Imagina pegar outros esportes...

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